segunda-feira, 23 de abril de 2018

A Teologia de Culto Reformado - 04,



Continuação do post anterior.

A doutrina que Calvino fez cada vez mais distintivamente sua foi a da Eleição. Pode ser dito que ele redescobriu o sentido da Igreja como o Novo Israel, o povo de Deus. Esta doutrina sem sombra de dúvida é refletida em sua teoria do culto. Ela produziu um profundo senso de honra e reverência perante Deus, que era enfatizado na liturgia pela leitura do Decálogo e pela confissão de fé que era feita pelos cristãos como uma unidade em Cristo. Não era menos sentida na profunda e espontânea gratidão que extravasava através do cântico de salmos pela congregação.
E foi esta doutrina, como também a da Comunhão como “sigillum Verbi” que fazia Calvino enfatizar a unidade da Comunhão antes da Santa Ceia. A comunhão era portanto não um mero apêndice ao ato da pregação, era o ato para os fiéis onde Deus selava suas promessas aos Eleitos. A doutrina da Eleição com sua reflexão na natureza corporativa do culto calvinista contrasta com o individualismo que caracteriza a liturgia Luterana.
Deixar esta matéria desta forma seria uma injustiça para a memória de Lutero. Deve ser reconhecido que Calvino teve que acomodar suas visões em três assuntos. Ele fez uma distinção entre os fundamentais e os não importantes pontos na forma do culto. Ele não vacilava por um momento de sua convicção de que todo o culto deve proceder da divina inspiração, e as tradições humanas não carregavam nenhum peso na adoração. Por outro lado, ele mantinha que em matéria de culto existiam tanto doutrinas fundamentais como também auxílios superficiais que conduziam a paz e concórdia que deveriam ser deixados para o julgamento dos Cristãos como indivíduos. Ele fez apenas três concessões, cada uma delas em matéria de forma, não de doutrina. Ele desistiu de sua fórmula de absolvição quando a população de Genebra a depreciou como novidade.
Ele também permitiu que a Santa Ceia fosse celebrada com pão não fermentado. Ele não desaprovou o uso de pão não fermentado no Sacramento, mas ele não gostou do método pelo qual esta mudança foi introduzida em Genebra, ou seja, ele desaprovou o modo arbitrário pelo qual o vizinho Cantão de Berna exigiu que Genebra adotasse esta prática. Sua terceira e maior concessão, foi a de se render ao requerimento dos magistrados de genebra em permitir a Ceia do Senhor ser celebrada apenas quatro vezes por ano. Este ponto não foi facilmente concedido e Calvino deixou registrado para a posteridade que sua convicção nesta matéria foi imposta pelos magistrados genebrinos.
Estas três concessões não podem ser comparadas em seriedade ou amplitude com as concessões feitas por Lutero. Sendo assim, Calvino não pode ser acusado de inconsistência ou conservadorismo na matéria de acomodação, porque ele sabia tanto a lógica de sua posição e que deveria ceder porque era minoria como porque os pontos em questão eram apenas de menor importância.
É na comparação da doutrina dos sacramentos de Calvino (e particularmente da Ceia do Senhor) com a de Lutero, que a anterior base teológica consistente aparece de forma clara. Não é apenas asseverar que Calvino era meramente lógico no seu tratamento dos Sacramentos, visto que ele reconheceu que existe um ministério impenetrável nos graciosos atos de Deus para com o homem, os quais a razão pode raramente provar. Assim, ele era um adorador de mente acurada. No entanto, sua doutrina dos Sacramentos era mais consistente teologicamente que a de Lutero. Como Barclay demonstra, os dois Reformadores eram concordes em quatro principais aplicações. Ambos condenavam qualquer doutrina que negava a necessidade de fé viva no receptor ou que ensinava que os sacramentos conferiam graça ex opere operato.
Ambos repudiavam a doutrina que mantinha que os Sacramentos deveriam ser entendidos num sentido meramente etimológico como distintivos ou testemunhos da profissão cristã. Em terceiro lugar, eles rejeitavam como inadequada a visão que os sacramentos representavam meras alegorias ou significativas exibições da verdade. Finalmente, ambos se opuseram a doutrina que expressava que a Ceia do Senhor era apenas um rito comemorativo.
Para ambos os sacramentos eram, positivamente, “sigilla verbi”, ou seja, eles eram sinais pelos quais Deus confirmava ou selava suas promessas ao seu povo. A diferença radical entre a visão atrasada luterana e a doutrina Calvinista consistia no fato que Lutero mantinha refere ao seu poder santificador pelo acompanhamento do auxílio de Deus. Lutero pensava que a objetividade do sacramento apenas poderia ser mantida se a eficácia inerente fosse postulada.
Asseverar a fé como uma pré-condição para a sua eficácia parecia para ele fazer os sacramentos dependerem da fé do receptor. Calvino estava bem ciente desta imputação, mas sua doutrina da Ceia do Senhor não pode ser acusada de subjetividade, desde que ele declara que a própria fé é um dom de Deus mediado pelo Espírito Santo. Lutero também achou dificuldade em manter uma crença numa mística união de Cristo com o crente na Santa Ceia, se alguém mantinha que o corpo ressurreto do Senhor era limitado.
Continua no próximo post.